22 de julho de 2004

a obra ao negro

Decidi encetar a minha carreira de escritor. Como não tenho imaginação, criatividade e talento para escrever uma obra original, resolvi copiar obras que, já tenho lido, gostei bastante.

Na arte, a inovação tem um valor bastante relativo. Em grande parte dos casos, o critério de qualidade de uma obra prende-se com o momento em que foi feita. Ou com o tema que retrata, ou com o próprio acto de execução da obra. Isto é válido para as chamadas artes plásticas, mas também se pode aplicar à literatura.
Peguemos num génio da pintura, um daqueles incontestáveis. Picasso, por exemplo. Se hoje alguém pintar à maneira de Picasso, com representações geométricas da realidade (arlequins bidimensionais sentados em mesas de cafés, gajas nuas e toscas num bordel qualquer, rostos onde um nariz anguloso fica por cima de um olho torto, etc.), com "fases" de cores apaneleiradas (azulinho e rosa), já ninguém liga. É mesmo impossível um consenso sobre a qualidade de tal obra - enquanto se se soubesse que ela tinha mesmo sido feita por Picasso, ganharia imediatamente um valor absurdo e seria adquirida num leilão inglês por algum excluído social.
Na literatura a situação é semelhante. Podemos hoje escrever belas cantigas de amigo, formalmente perfeitas, que ninguém liga. «Ai flores, ai flores do verde pinho / se sabedes novas do meu amigo / ai deus, e u é?». É u é o quê? Literatura gay e light, é o que é! Ainda por cima não venderia nada.

Assim, escrevi já algumas obras consagradas de autores contemporâneos. Ontem acabei o Memorial do Convento. Já tinha escrito há uns meses A Morte de Carlos Gardel e as Memórias de Adriano. Também escrevi este ano a Desgraça (sim, não foi só o Coetzee...), A Tábua de Flandres e As Velas Ardem Até Ao Fim. No ano passado escrevi As Partículas Elementares, As Núpcias de Cadmo e Harmonia (este deu-me um trabalhão!), Cem Anos de Solidão, Outono na Sertã, Extinção, Um Deus Passeando Pela Brisa da Tarde e Casei com um Comunista.

Creio que estou perto de ganhar o Nobel. Já escrevi mais e melhores livros que muitos "escritores" que andam por aí.

2 Comments:

Blogger Anjo élico said...

Excelentes escritos os teus. Os meus parabéns. E até o título ajudou-te a consumar tamanho empreendimento

24 de julho de 2004 às 18:40  
Anonymous Anónimo said...

Mto bom, então depois de ler a MYourcenar inspirou-se em Pierre Menard? olhe q só lhe falta escrever o Quijote em letra miúda pª ser o JLBorges :)

Boa ideia, em td o caso *

m. (aka AzulCobalto)

23 de agosto de 2004 às 14:10  

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